Bem vindos ao Adelós-Dêlos!

Ponto de discussões filosóficas de ouvintes do Lógos, recolhedoras do aberto...

... porque o invisível (adelós) por vezes fica visível (dêlos), pela escuta do que se diz com uma palavra.



terça-feira, 16 de setembro de 2008

A IDÉIA DO BEM COMO IDÉIA SUPREMA: potenciação do ser e do desencobrimento

As idéias, diz Platão, estão no hypèr ouránios tópos, que ele também chama de tópos noetós, o lugar da compreensão. Tà noetà, as coisas compreendidas, são as idéias. Há uma idéia suprema, a idéia do bem, que Platão chama de teleutaîa idéa, a idéia que está no e é o fim. Mas fim não é meta nem término, mais o âmbito, o confim, o horizonte que tudo abrange (ou seja, a totalidade do ser sendo). A imagem desta idéia é o sol. Platão apresenta esta “imagem-símbolo” porque não se pode simplesmente representar corriqueiramente a idéia do bem num conceito. Mas isso não significa que ela seja algo “esotérico”, “intuitivo”, algo como uma “iluminação mística”, pois o próprio filósofo diz que só se a contempla por um questionamento persistente.

Agathós, no sentido grego, não é o bem moral oposto ao mal e ao pecado, ou seja, o bem cristão. Também não é o bem genérico e indiferente, do tipo “estou bem”, quando se responde corriqueiramente. É um bem no sentido do decidido: “está bem!”. Daquilo que impõe e exige realização, aquilo que dá consistência em que algo venha a ser. Neste sentido, já que idéia é o que possibilita ser e consiste em ser, idéia é propriamente um bem. Por isso a idéia do bem é como uma idéia da idéia, ou seja, a idéia por excelência.

O governo do filósofo não é o governo dos professores e alunos de filosofia, mas o governo daquele(s) que persiste(m) na guarda e vigia (como phýlakes) deste bem do bem, idéia da idéia, no sentido de fim e princípio que impõe e exige a realização dos homens e entre os homens, na pólis.

fonte: HEIDEGGER, Martin. Ser e Verdade. Petrópolis: Vozes, 2007.

2 comentários:

Renata Renovato disse...

Diego...

Me parece que o bem é exatamente algo inqualificável, indemonstrável e por isso mesmo incompreensível. Se levarmos a compreenão do bem ( idéia da idéia) pro lado místico, chegamos a uma figura mística que nos facilita a interpretação mas nos dificulta a aproximação daquilo que Platão quis dizer. Através da razão esse bem se torna compreensivo apenas se o identificamos através de analogia. Pois então, esse "está bem" me parece tudo aquilo que envolve, possibilita, gera, é...mas que nem por isso está envolvido...

Ótimo texto!

Anônimo disse...

Há uma ligação entre o Bem e "o que deve a cada vez ser" que é muito elucidativa desta questão, na minha maneira de entender.

- O bem não é uma coisa boa. Esta discussão é explícita na República, acerca do justo. O bem não é "algo", não é, portanto, um ente.

- o sentido grego de bem não é o sentido cristão. Agathós não tem nenhuma significação moral. Agathós não se opõe ao mal e ao pecaminoso. Só há pecado onde há fé cristã.

- Por outro lado, não quer dizer que Agathós seja um bem "atenuado", um bem "menor", um bem "não plenamente desenvolvido". Também esta é uma perspectiva estritamente cristã. É "menor" em comparação ao "maior" (o bem cristão), é menos desenvolvido, porque foi desenvolvido plenamente pelo cristianismo.

- O agathós se liga à compreensão mútua de um dialogo, ao que estabelece uma coisa "tal como ela deve ser", como ainda hoje dizemos "está bem!" quando há uma compreensão, num diálogo. O agathós, o "bem grego", é o que impõe, funda e destina alguma coisa para ser tal como ela é.

- Por isso o bem é a idéia suprema, que sustenta, funda e destina tudo que é (idéias) tal como é.

"A idéia suprema é o que possibilita tanto o ser quanto o desencobrimento (alétheia). O bem, agathón, é uma palavra da língua de todo dia, que não diz senão o que possibilita, sobretudo,o que se impõe e determina. Agathón nunca diz um conteúdo ou teor, e sim diz mais um "como", modo privilegiado de ser" (H. ser e verdade, p. 211)